Alguns estudos indicam que o cigarro (nicotina) pode afetar de forma negativa a utilização de certos medicamentos, especialmente de antibióticos. No entanto, não há estudos que indiquem que a nicotina possa afetar o uso do Misoprostol.
Desta forma, a paciente que fizer o procedimento de aborto químico com Misoprostol não precisa de se preocupar com o uso do cigarro antes, durante ou depois do procedimento.
Fumar cigarros durante o procedimento de aborto não interfere na sua eficácia.
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Sabe-se que o tabaco proporciona sensações que criam dependência e que tornam difíceis as tentativas de desistência do mesmo. Segundo a OMS, em 2016 20% da população fumou tabaco[1]. Segundo Ashton et al. 1973, na sua publicação, duas das sensações que os fumadores sentiam com o tabaco eram de relaxamento ou estimulação[2], motivo pelo qual é possível que as pessoas sintam que precisem de recorrer ao seu uso em situações de maior stress.
Tragar um cigarro produz um rápido efeito estimulante no sistema nervoso central, semelhante àquele descrito pelos usuários de cocaína/crack.
Marques et al., 2001[3]
Está comprovado que o uso de tabaco afeta a forma como outros medicamentos têm efeito no organismo. Por exemplo:
- A nicotina interfere no uso das benzodiazepinas (utilizados no tratamento da ansiedade sintomática e alterações do sono[4]). Segundo António, 2013[5], a nicotina ativa o sistema nervoso central, e por esta razão, o seu consumo de forma concomitante com estes medicamentos diminui o efeito sedativo destes últimos;
- O mesmo acontece com os analgésicos. Fumadores apresentam menor tolerância à dor, o que obriga a maiores doses para controlar o desconforto físico[6].
No caso de uma gravidez, o tabaco pode ter ainda consequências mais negativas já que o seu consumo se encontra associado a um maior número de abortos espontâneos, maior ocorrência de rotura de membranas ovulares, placenta prévia, descolamento prematuro da placenta, sangramentos vaginais, aumento da pressão arterial e frequência cardíaca, retenção de líquidos, entre outros[7].
É normal que exista a dúvida relativamente à influência negativa que o tabaco possa ter na eficácia dos comprimidos. Até a data não existem estudos que mostrem interferência do tabaco usado ao mesmo tempo que o Misoprostol. Podes fumar antes, durante ou depois do procedimento, visto não existir nenhuma interação entre ambos agentes. Porém, não incentivamos o uso de tabaco devido aos riscos que acarreta para a saúde e que fazem parte do conhecimento geral.
Da mesma forma, se estiveres a usar um sistema transdérmico (adesivos/pensos de nicotina), à partida não tens com que te preocupar. Não existem estudos que indiquem a interação entre os fármacos abortivos e a nicotina na forma de adesivo.
Se a tua dúvida passa pelo uso dos cigarros eletrónicos (ou vapers), – dispositivo de administração de nicotina que faz uso de uma bateria em vez da combustão típica de um cigarro (António, 2013) – existem estudos sobre o uso destes dispositivos, mas ainda é difícil encontrar conclusões exatas[8] que demonstrem os seus efeitos, tal como acontece com a sua influência nas possíveis interações com medicamentos. Porém é importante saber que estes dispositivos, para além do vapor de água, também contêm nicotina. Segundo Marques, 2016, embora aparentem ser menos tóxicos, os cigarros eletrónicos também possuem os seus riscos[9], dada também a existência de outras substâncias.
Graças a esta mesma falta de conclusões e inclusive de alguns estudos mais específicos, é difícil dizer se haverá algum tipo de influência negativa relativamente ao uso concomitante com o Misoprostol (Cytotec – 200 mcg), porém, com base no que foi descrito anteriormente, se a nicotina presente num cigarro normal não prejudica a eficácia do fármaco para o aborto, então à partida, o seu uso não será prejudicial no processo do aborto químico. De acordo com Frankhauser, 2013[10], os cigarros eletrónicos não produzem as mesmas interações medicamentosas (tais como as que mencionamos no início deste texto) como as que o tabaco normal produz.
Até agora temos falado sobre o tabaco – cujo principal princípio ativo é a nicotina[11] – mas gostávamos de abordar o assunto também tendo como pressuposto o uso de outro tipo de substâncias (drogas ilícitas tais como marijuana, cocaína, heroína, anfetaminas, entre outros). Os nossos serviços aconselham que a paciente se abstenha de fazer uso das mesmas devido à grande influência que estas podem ter no discernimento pessoal.
Na maioria dos casos, as pessoas consomem substâncias psicoativas porque esperam tirar benefício de tal consumo, seja por prazer ou para evitar dores, incluindo o consumo social. Mas o seu consumo também implica potencial de dano, a curto ou a longo prazo.
OMS, 2004[12]
Tomar a decisão de levar a cabo a terminação de uma gravidez não pode ser feita de ânimo leve. A mulher precisa de estar segura da sua posição e para tal finalidade não é conveniente estar sob a influência de agentes que podem alterar o seu estado psicológico.
Nesta categoria também estão classificados os acidentes devidos a efeitos de substâncias sobre a coordenação física, a concentração e o discernimento, em circunstâncias onde sejam necessárias tais qualidades.
OMS, 2004
O mesmo acontece com a ingestão de bebidas alcoólicas. Aborto na Nuvem assume uma posição completamente contra o uso de álcool antes, durante e algum tempo depois do procedimento de aborto devido também à forma como influencia a capacidade de raciocínio dos indivíduos.
Se tiveres dúvidas, convidamos-te a ler mais sobre este assunto aqui: Posso ingerir bebidas alcoólicas?
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Referências:
[1] OMS: 1 em cada 5 pessoas no mundo fuma. Nações Unidas no Brasil, 2018. Disponível em https://nacoesunidas.org/oms-1-em-cada-5-pessoas-no-mundo-fuma/
[2] Ashton H, Millman J, Telford R, Thompson J. Stimulant and depressant effects of cigarette smoking on brain activity in man,1973. Aug; 48(4): 715–717. Disponível em: https://bpspubs.onlinelibrary.wiley.com/doi/pdf/10.1111/j.1476-5381.1973.tb08260.x
[3] Marques AC, Campana A, Gigliotti A, Lourenço M, Ferreira M, Laranjeira R. Consenso sobre o tratamento da dependência de nicotina. Rev Bras Psiquiatr 2001;23(4):200-14. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/rbp/v23n4/7168.pdf
[4] Benzodiazepinas e análogos. Direção de Informação e Planeamento Estratégico. Versão 1.2, 2017. Disponível em: http://www.infarmed.pt/documents/15786/2219894/Utliliza%C3%A7%C3%A3o+de+Benzodiazepinas+e+an%C3%A1logos/adb100fa-4a77-4eb7-9e67-99229e13154f
[5] António M. Interações do Tabagismo com a Terapêutica Farmacológica. Instituto Superior de Ciências da Saúde Egas Moniz, 2013. Disponível em: https://comum.rcaap.pt/bitstream/10400.26/14164/1/Ant%C3%B3nio%2c%20Mara%20Guedes.pdf
[6] Franken R, Nitrini G, Franken M, Fonseca A, Leite J. Nicotina. Ações e Interações. Arq. Bras. Cardiol. Volume 66, (nº 1), 1996. Disponível em: http://publicacoes.cardiol.br/abc/1996/6606/66060009.pdf
[7] Santos H, Oliveira G, Soares P, Araújo W, Almeida E, Oliveira M. Os malefícios do uso do tabaco na gestação e suas complicações ao feto. Rev. enferm. UFPE, Recife, 9 (Supl. 9):9978-82, nov. 2015. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/viewFile/10796/11958
[8] Callahan-Lyon P. Electronic cigarettes: human health effects. Tob Control 2014;23: ii36–ii40. Disponível em: https://tobaccocontrol.bmj.com/content/23/suppl_2/ii36.full
[9] Marques J. Cigarro Eletrónico. Epidemiologia do uso do cigarro eletrónico. Malefícios e efeitos na saúde dos utilizadores e da exposição ambiental. Eficácia na cessação tabágica. Revisão bibliográfica. Universidade da Beira Interior, 2016. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/304658551_Cigarro_Eletronico_Epidemiologia_do_uso_do_cigarro_eletronico_Maleficios_e_efeitos_na_saude_dos_utilizadores_e_da_exposicao_ambiental_Eficacia_na_cessacao_tabagica_Revisao_bibliografica
[10] Frankhauser M. Drug interactions with tobacco smoke: Implications for patient care. Current Psychiatry Vol. 12, No. 1, 2013. Disponível em: https://mdedge-files-live.s3.us-east-2.amazonaws.com/files/s3fs-public/Document/September-2017/1201CP_SavvyPsych.pdf
[11] Silva B, Barbosa F, Neves J. Uso irracional da nicotina junto a medicamento e suas interações. II Congresso Brasileiro de Ciências da Saúde. Disponível em: http://www.editorarealize.com.br/revistas/conbracis/trabalhos/TRABALHO_EV071_MD4_SA3_ID2084_10052017131833.pdf
[12] Neurociências: consumo e dependência de substancias psicoativas. Organização Mundial da Saúde Genebra, 2004. Disponível em: https://www.who.int/substance_abuse/publications/en/Neuroscience_P.pdf
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